Agni |
Krishna e Arjuna, caçavam na floresta que circundava Indraprasta, rindo e lembrando coisas engraçadas, enquanto espreitavam os animais que ameaçavam os rishis que viviam na floresta.
Num dia especialmente quente, estavam sentados sob a sombra de uma grande árvore banian quando, para surpresa deles, um brâmane de aparência estranha apareceu no bosque. Tinha a pele acobreada, com cabelos e barba amarelos e brilhantes. Seus olhos avermelhados eram como pétalas de lótus, e o corpo forte e bem delineado.
Vendo esse brâmane que brilhava como fogo, Krishna e Arjuna imediatamente se levantaram respeitosamente e, de mãos postas, Krishna perguntou: “O que podemos fazer pelo senhor?”
“Sei que vocês dois são os melhores dos homens”, o brâmane respondeu numa voz ressonante. “Vim pedir minha comida. Entretanto, não sou um brâmane comum. Saibam que sou Agni, o deus do fogo. Desejo comer essa floresta inteira onde estamos. Por favor, ajudem-me”
E o deus explicou que tinha tentado várias vezes consumir a floresta, mas que esta se encontrava sob a proteção de Indra. “Existe uma naga que vive aqui que é amiga de Indra. Cada vez que me espalho para devorar a floresta, Indra manda chuvas torrenciais. Só vocês podem evitar isso. E eu preciso comer essa floresta, pois ela contém muitas ervas medicinais.”
Agni contou como tinha adoecido depois de consumir muita ghee num grande sacrifício feito pelo rei Swetaki, um ancestral de Krishna. Se pudesse comer as ervas da floresta, ficaria curado. O grande criador, Brahma, tinha dito a Agni que ele deveria pedir a ajuda de Krishna e Arjuna. “Esses dois são os antigos Nara e Narayana, os rishis divinos”, disse Brahma. “Agora desceram à terra para cumprir propósitos divinos dos deuses. Assim, peça a ajuda deles.”
Arjuna também ficou de mãos postas para o deus e disse: “Gostaria muito de ajudá-lo, senhor, e na verdade possuo muitas armas poderosas com que posso lutar até mesmo contra seres celestiais. Entretanto, não tenho um arco tão poderoso para enfrentá-los. E, mesmo que tivesse tal arco, também precisaria de um número inexaurível de flechas e um carro adequado de onde lutar.”
Agni sorriu. “Você já os terá.” Invocou Varuna, deus dos mundos subterrâneos e das águas profundas, e a divindade logo apareceu. Agni lhe pediu: “Ó senhor das profundezas, por favor me entregue o arco e as flechas que pertenceram ao rei Soma, assim como o seu carro, decorado com uma bandeira com um macaco. Arjuna precisa deles a fim de alcançar grandes feitos para os deuses.”
Varuna era o guardião das armas celestiais, que mantinha ocultas nas profundezas do oceano. Imediatamente fez aparecer o carro e as armas, e Agni os entregou a Arjuna. O pandava olhou espantado para o arco, que Agni lhe disse chamar Gandiva. Alta como um homem, a arma brilhava como o arco-íris e era coberta de gemas preciosas. Nenhuma falha, nenhum sinal de fragilidade em qualquer de suas partes. Depois de reverenciar Agni, Arjuna tomou o arco e se aproximou do grande carro, que estava cheio de armas celestiais, inclusive dois feixes inexauríveis de flechas. Ao carro estava atrelada uma parelha de cavalos prateados da terra dos gandarvas. Parecendo uma nuvem noturna e refletindo o esplendor do Sol, o carro deslumbrante ainda tinha um alto mastro de ouro com uma bandeira com a figura de Hanuman, o famoso macaco amigo e criado de Rama, que emitia gritos agudos.
Quando Arjuna subiu ao carro e vestiu a armadura celestial que ali encontrou, Varuna apresentou um disco a Krishna. “Aqui está sua arma imortal, Sudarshana”, disse, entregando-lhe o disco refulgente que parecia um circulo de fogo. “Saindo de sua mão num voo giratório, essa arma dentada poderá degolar qualquer criatura nos três mundos. E aqui está, também, sua maça, a Kaumodaki, capaz de esmagar as hordas de daitias e danavas.”
Depois de entregar as duas armas a Krishna, Varuna o reverenciou e desapareceu. De pé no carro e fechado dos pés à cabeça em sua armadura, Arjuna brilhava. Krishna pulou para o assento do auriga e tomou as rédeas na mão, dizendo que guiaria o carro para Arjuna. Em tom heroico, Arjuna disse para Agni: “Ó grande divindade, acenda-se e espalhe-se o quanto puder. Com o Gandiva como arma e Krishna como meu auriga, estou pronto para enfrentar até a hoste celestial inteira!”.
Num instante Agni apresentou sua forma brilhante e cercou a floresta. Chamas imensas lambiam a vegetação e nuvens densas de fumaça negra se espalhavam pelo céu. Os ruídos dos galhos secos se tornou ensurdecedor e o ar se encheu de um cheiro sufocante. Os lagos e as poças da vasta floresta ferviam até secar e as pedras incandesciam.
Nos céus, Indra ficou alarmado. Seu amigo naga Takshaka parecia estar em perigo. O rei dos deuses, então, enviou nuvens maciças para a floresta, que logo começaram a relampejar e despejar grande volume de água. Mas a conflagração era tão intensa que a chuva simplesmente se transformou em vapor e subiu para os céus. Indra fez aparecerem outras nuvens, maiores ainda, e grandes colunas de água começaram a apagar as chamas.
Vendo isso, Arjuna invocou o vento à sua arma Vayavya e, atirando-a para cima, fez com que todas as nuvens se dispersassem. Indra ficou zangado e juntou muitos guerreiros celestiais para desafiar Arjuna. Milhares de asuras, gandarvas, iakshas e nagas apareceram no céu e atiraram suas armas sobre Arjuna.
O pandava contra-atacava com habilidade incomparável. Com o Gandiva constantemente aberto, em ação, atirava flechas aos milhares, carregadas com a força das armas celestiais. Devido à excelente direção que Krishna dava ao carro, este voava e evitava os dardos que choviam do céu.
Vendo Arjuna derrotar com sucesso o exercito dos céus, Indra, então apareceu pessoalmente, acompanhado de todos os deuses principais. Embora impressionado pelo poder do próprio filho, estava determinado a mostrar sua superioridade.
Uma a uma as divindades lançaram suas armas sobre Arjuna. Yamaraja atirou seu cajado da morte; Surya, seu dardo; Varuna, seu laço; e Indra, seu terrível relâmpago. Dúzias de outros deuses também arremessaram suas armas, mas Arjuna permaneceu intocado em seu carro. Com suas flechas mágicas, recebia todos aqueles mísseis. E tantas foram às flechas disparadas por Arjuna que elas pareciam sair de seu arco numa linha contínua. Simplesmente pela força e velocidade de seus braços e pelo Gandiva, conseguiu anular o ataque dos deuses. E todos elogiaram seu poder.
Então, ouviu-se uma voz no céu, que dizia: “Ó Indra, seu amigo Takshaka não está aqui”. Desista da batalha. O incêndio dessa floresta e dos seres pecaminosos que vivem nela foi ordenado pela fatalidade. Você não poderá vencer Arjuna e Krishna!
Reconhecendo a voz de Brahma, os deuses retiraram-se da luta.
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